“A burguesia brasileira é selvagem, racista e escravista”, diz Lincoln Secco”.
A classe média brasileira é
extremamente corrupta. Essa é a avaliação do historiador Lincoln Secco, professor do
Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP) e autor do
livro História do PT (Ateliê Editorial, 2011). Segundo
ele, a disputa está agora no campo dos valores, aquele em que o PT deixou de atuar.
Em entrevista exclusiva à Antônio David do Brasil de Fato,
19-02-2014, Lincoln Secco analisa, entre
outras questões, o papel do Partido dos Trabalhadores (PT) e suas transformações. Para ele, as transformações
materiais pelas quais o PT passou
afetaram tanto as alas de esquerda quanto as de direita porque todas tiveram
que se profissionalizar e aceitar que fazem parte do governo. “Não acredito
mais que haja contestação da ordem no PT. Há de maneira
individual ou em tendências minoritárias que não têm a mínima chance de ganhar
a direção”.
Segundo ele, é preciso entender
que Lula mudou a estrutura de classes no Brasil e ao
mesmo tempo não atacou concretamente a herança de FHC, o qual mudou a composição patrimonial do
capitalismo no Brasil. “Ao entender a nova dinâmica das classes, a esquerda
poderia começar a organizar a nova classe trabalhadora. Se é que isso é
possível agora”.
Eis a entrevista.
Em seu livro História do PT,
você afirma que o Partido dos Trabalhadores concorreu decisivamente para
“civilizar” a sociedade civil, conquistando nela um espaço político para os
trabalhadores, tornando as greves legítimas. Gostaria que você explicasse
melhor essa ideia, trazendo-a para os dias atuais.
Florestan Fernandes dizia que nós
temos uma sociedade civil não civilizada. Falava em capitalismo selvagem (a
expressão era dele) e que cabia ao movimento operário cavar um espaço para os
subalternos na sociedade civil. A gente esquece que nos anos de 1980 os
trabalhadores não podiam fazer greve. Faziam, mas era proibido. Não é que um
juiz julgava a greve abusiva. O Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) simplesmente prendia todo mundo e cassava a
direção do sindicato. É óbvio que a repressão continua de outra forma, mas
o PT significou um polo antagônico dentro da
sociedade civil. Os pobres também não podiam sequer ter certeza de comer no dia
seguinte. Eu me lembro que era muito comum garotos de periferia terem só uma ou
duas camisetas dadas por políticos. Na periferia não havia hipermercado e quase
nunca se tomava iogurte que o pessoal só chamava de “danone”. As mulheres não
compravam absorventes e não havia papel higiênico, só tiras de jornal pregadas
na parede. Antigamente talvez fosse assim para quase todo mundo. Mas nos anos
de 1980 a classe média já tinha tudo isso e os pobres não. O PT com todos os seus desvios continuou sua tarefa
histórica ao realizar a diretriz de seu V Encontro de 1987: a criação de um
mercado interno de massas.
Nesse mesmo livro, você utiliza com
frequência a expressão "solo histórico" para afastar a ideia de que
os limites do PT devam-se apenas à vontade ou à falta de vontade da direção do
partido. Novamente, gostaria de pedir que você explique essa ideia.
O PT emergiu num momento em que o Brasil vivia dois processos internos determinantes: a crise econômica e política da Ditadura. Com isso, mascaravam-se mudanças externas que só aportariam mais tarde no Brasil sob a forma do neoliberalismo. Este “atraso” permitiu aquilo que eu chamo de Revolução Democrática que se deu entre 1984 e 1989. A “revolução” não venceu, mas nos deu um arcabouço constitucional progressista e um partido socialista de massas. Vivíamos um longo ciclo internacional recessivo desde os anos 70. O PT foi um ponto fora da curva. Não surgiu nada como ele em outros países latino-americanos. Quando este partido se estabelece como alternativa de poder, eis que o vendaval do neoliberalismo arrasa os sindicatos, destrói os empregos e joga o PT no canto do ring. Estávamos numa conjuntura de derrota política do neoliberalismo que podia ser aproveitada de maneira mais radical, o partido tinha se popularizado, mas ao mesmo tempo o partido tinha se profissionalizado e incorporado valores dos seus adversários. O neoliberalismo persistia na esfera dos valores. Neste contexto é difícil dosar o quanto transformações estruturais do partido e da sociedade e opções conscientes dos dirigentes responderam pela moderação do PT. Prefiro dizer que não dava para fazer muito desde 2003. Mas dava para fazer mais.
Em Os
sentidos do lulismo, o cientista político André Singer sustenta que no
PT ainda coexistiriam “duas almas”: ao lado da alma da aceitação da ordem,
coexistiria a alma da contestação dessa mesma ordem. Você concorda com essa
imagem.
É uma boa escolha estilística. Mas
não acredito mais que haja contestação da ordem no PT. Há de maneira individual ou em tendências
minoritárias que não têm a mínima chance de ganhar a direção. O problema não é
esse. Não acredito que o PT trocou sua alma. Ele passou por um aggiornamento
gradual como um todo. Isso se deveu às escolhas que ele fez em 2002 e ao “solo
histórico”, como já conversamos aqui. As transformações materiais pelas quais o
PT passou afetaram tanto as alas de esquerda quanto as de direita porque todas
tiveram que se profissionalizar e aceitar que fazem parte do governo. O que não
quer dizer que as alas e as pessoas sejam iguais em suas crenças, compromissos
ideológicos e esperanças, é óbvio.
André Singer argumenta também que o PT
teria adquirido "características que lembram as do PTB anterior a
1964". Você concorda com essa comparação?
Se pensarmos em termos da “função”
do PTB no “sistema” político da época, talvez o
paralelo seja correto. Ao longo do tempo ele atingiu os votos dos pobres urbanos
e teve dificuldade de se implantar em São Paulo onde disputou com o voto
popular conservador de Ademar, Jânio etc. Só que o PTB foi criado de cima para
baixo por um ex-ditador enquanto o PT foi autenticamente popular. Os
analfabetos não votavam, a instabilidade político-militar era muito maior, as
pressões golpistas dos Estados Unidos eram explícitas e a Constituição de 1946
era muito mais conservadora do que a atual. São ambientes totalmente distintos.
O que dá para pensar é em algumas permanências daquele ambiente político, sem
esquecer que tivemos uma Ditadura Militar no meio que destruiu a vida política
e cultural do Brasil.
Em seu livro, ao abordar as
transformações sofridas pelo PT, você indaga: “Mas é melhor manter os
princípios e nunca chegar ao governo e não fazer mudanças favoráveis aos mais
pobres? Chegar assim ao poder muda essencialmente a sorte dos de baixo?”. Com
base nessas questões, como você avalia o debate na esquerda sobre a experiência
dos governos Lula e Dilma?
Se você se refere aos pequenos
partidos críticos do PT, eles não
permaneceram pequenos porque seus objetivos programáticos estão errados. A
crítica deles às insuficiências do governo e até aos desmandos brutais e
alianças corrompidas é correta. Mas eles têm uma cegueira ideológica que impede
avaliar a conjuntura. Não quero dizer que algum gênio avaliaria corretamente,
mas uma direção partidária deveria fazê-lo. O primeiro passo é entender
que Lula mudou a estrutura de classes no Brasil e ao mesmo
tempo não atacou concretamente a herança de FHC, o qual mudou a
composição patrimonial do capitalismo no Brasil. Mas qual esquerda discute
isso? Por incrível que pareça setores internos do PT promovem este debate. O livro do André Singer contribuiu muito. A Fundação Perseu
Abramo do PT também. Ao entender a nova
dinâmica das classes, a esquerda poderia começar a organizar a nova classe
trabalhadora. Se é que isso é possível agora.
Pouco tempo depois do escândalo do
“mensalão” ter estourado, ocorreram eleições internas no PT. Em seu livro, ao
abordar as eleições no PT ocorridas em 2005, você afirma: “a militância do PT
salvou o partido”. Por quê?
Naquele momento a militância
tradicional já estava afastada. Ela se mantinha como uma torcida na
arquibancada. Não tinha mais pretensões de jogar. A crise de 2005 reacendeu por
um átimo a chama da velha militância petista e ela foi silenciosa, mas
corajosamente defendeu o PT. Organizações
como o MST e a UNE foram
importantes, mas os militantes anônimos é que foram ao PED (processo de eleição direta) quando a imprensa
vaticinava baixo comparecimento e o fim do partido. O PED fez com que os setores da oposição que
desejavam a derrubada de Lula percebessem que
o custo político seria alto demais. Derrotar assim um partido de massas e um
presidente com a história do Lula mantendo a
fachada democrática seria impossível. É claro que setores da burguesia não
estavam incomodados com o governo e não desejavam (como nunca desejam) crises
políticas que afetem os negócios. Mas aquela era uma crise eminentemente
política e as decisões foram tomadas em função da relação entre o custo
político do impeachment e a esperança de vitória da oposição em 2006.
Na sua opinião, qual é o significado
político das campanhas de doação financeira para o pagamento das multas de José
Genoíno e Delúbio Soares? Aqui também se pode dizer que a militância salvou o
partido?
Neste caso, eu acho
que a militância não salvou o partido porque se ele quer ser salvo de alguma
coisa é da própria lembrança do chamado mensalão. Ela talvez tenha sido
incômoda para os dirigentes atuais porque os impede de esquecer seus antigos
líderes que estão presos.
Ainda com relação ao escândalo do
"mensalão", em seu livro você critica a passividade da direção do PT,
que, na sua opinião, não politizou a crise. Por que a direção petista deveria
ter politizado a crise e como você avalia a postura da direção do PT agora,
pós-julgamento?
Esta é uma questão que precisa ser
situada em três tempos. Na crise de 2005 era possível politizar e confrontar.
Havia risco? Sempre há. Mas o PT teria saído
com mais força ainda para fazer reformas profundas no II mandato. O PT não quis politizar a crise e deixou a
iniciativa para a oposição. Ela continua politizando o “mensalão” até hoje. O
segundo tempo foi o do julgamento, calculado para atrapalhar as pretensões
eleitorais do PT. Naquele momento as perspectivas
de politização eram menores e a tática do avestruz empregada por Lula “já tinha
dado certo”. Afinal, o PT foi o grande
vitorioso nas duas ultimas eleições (2010 e 2012). Agora estamos no terceiro
tempo: os réus já estão condenados e presos. Não há mais nada a ser feito. Eles
só serão soltos quando cumprirem parte de sua pena e politicamente já estão
fora do jogo. E exatamente nesta etapa é que a direção do partido deu o maior
número de declarações contra o julgamento. Ainda foi uma reação tímida. Mas a
militância do PT aprendeu que o “mensalão”
não interfere no resultado eleitoral e foi além de sua direção na solidariedade
aos condenados.
Quais são as implicações políticas do
julgamento do “mensalão” e da prisão de dirigentes do PT?
Este já é um assunto da história
do PT. Não tem mais a mínima importância para os
dirigentes atuais, salvo o constrangimento de ter que dar satisfações eventuais
aos militantes. É óbvio que se pudessem escolher, eles prefeririam ver José
Dirceu absolvido. Não é disso que se trata. A hora da reação já passou há
muito. Exceto se houvesse uma improvável radicalização do governo num possível
terceiro mandato, a crise de 2005 poderia ser reavaliada. Hoje o fato é este:
o PT foi derrotado politicamente, apesar de suas
vitórias eleitorais. Em nenhum partido social democrata do planeta seria normal
aceitar a prisão de dois ex-presidentes do partido num julgamento totalmente
político. Nem vou discutir o mérito das acusações. O julgamento é político
porque as inovações que ele comporta foram casuísticas e só valeram para o PT.
Juristas conservadores se assustaram com os vícios formais e o desrespeito à
lei.
Como você avalia o resultado do último
PED, que consagrou Ruy Falcão como presidente do PT com uma votação superior a
70% dos votos?
Eu poderia explicar o número com
exemplos que ouvi dentro do PT, mas prefiro não
enveredar pelo caminho das denúncias de filiações em massa e falsificação de
votos. Não que isso não seja importante. Mas sempre aconteceu no PT em alguma
medida. Há dois aspectos da vitória de Ruy Falcão por
ampla margem. O primeiro deriva da profissionalização da militância e do uso de
recursos financeiros. Mas o segundo tem a ver com o apoio incondicional que a
nova base de filiados ao PT dá de fato ao governismo.
Na sua opinião, que implicações as
manifestações de junho tiveram do ponto de vista da correlação de forças na
sociedade? O PT e o governo Dilma souberam aproveitar a energia das ruas?
Junho iniciou um
novo ciclo político no Brasil. Novíssimos movimentos sociais assumiram mais
legitimidade popular do que os partidos tradicionais e estes terão que mudar. O
governo ficou acuado juntamente com todo o sistema político. Mas Dilma foi quem
ofereceu a resposta mais avançada: a reforma política. Mas o problema não está
no conteúdo da reforma, rapidamente rechaçado por todos os partidos. Está na
forma. Por que os políticos aceitariam reformar-se? E por que ela resolveu se
dirigir a eles? Acredito que ela quis dar uma satisfação às ruas sem se
comprometer realmente com a reforma. Ou seja, ela não esperava nada de sua
proposta. Caso contrário teria se dirigido às ruas. Só que um governo de
coalizão com partidos conservadores como o dela não pode fazer isso.
Como você encara a declaração do
ex-presidente Lula, em seu artigo no New York Times publicado logo após as
manifestações, de que o PT "precisa renovar-se profundamente"?
Ele também foi o que dentro do PT deu declarações mais favoráveis aos protestos
de junho. Mas prefiro não comentar.
Você é um dos autores do livro Cidades
Rebeldes. Em seu artigo, você afirma que o MPL, organização horizontal e
autonomista, mas dirigente, foi o ator mais importante na primeira fase dos
protestos [de junho]. Na sua opinião, que papel o MPL poderá cumprir na
conjuntura política do país?
A geração que saiu às ruas certamente
vai fornecer no futuro os melhores quadros de esquerda do Brasil. Neste caso,
não me refiro ao MPL apenas, embora os seus
jovens membros tenham uma qualidade de leitura da conjuntura e uma capacidade
de luta que muitos partidos de esquerda não têm. Eu admiro os que eu conheci na
USP. É possível que o MPL continue sendo o principal
atrativo para manifestações legitimadas por amplos segmentos sociais. Mas mesmo
que o MPL não seja essa força principal, o conjunto dos
novíssimos movimentos sociais vai cumprir este papel. Eles vão continuar
demonstrando que há insatisfação na sociedade.
Qual é a sua opinião sobre os Black
Blocs?
Trata-se de uma
tática. Depende do momento já que a tática é a arte de operar com os meios que
você tem no “campo de batalha”. Alguém pode condenar um mascarado que se
protege da espionagem policial e de suas prisões arbitrárias O problema desde
junho de 2013 não está na destreza tática dos jovens. Isso eles têm de sobra.
Está na ausência de uma estratégia política. Ou seja, na arte de conduzir
inúmeras batalhas para vencer a “guerra”.
Há poucos dias você publicou um artigo
no qual fala dos riscos da “democracia racionada”, e que estaríamos diante de
um dilema: “mais democracia ou mais um passo para trás”. Por quê?
Porque essa é a
nossa tradição histórica. A burguesia brasileira é selvagem, racista e
escravista. Ela não aceita de fato a democracia. Só o discurso democrático. É
mais ou menos como aquela burguesia paulista que em 9 de julho de 1932 se
mobilizou pela democracia e dois dias antes prendeu todos os comunistas e
anarquistas. A democracia racionada é basicamente assim: quando se abandona uma
ditadura aberta, permite-se que os direitos políticos avancem, mas não os
sociais. Mas isso é impossível, por isso também os direitos sociais avançam.
Diante disso, a política recua. O que há de novo em nossa época é o uso
ostensivo do poder judiciário para barrar os avanços sociais sem afetar a
fachada democrática.
Num artigo publicado recentemente, você
fala do “direito à violência”, e argumenta: “o isolamento a que estão sendo
condenados os novíssimos movimentos sociais é produto da recusa da
contraviolência legítima”. Por quê?
É que há um
consenso proveniente da Ditadura: manifestantes devem apanhar calados. Ora, se
há uma polícia militar que é uma criação da Ditadura, acostumada a violar seus
direitos, por que você não pode se defender? Nem sou tão radical quanto às
constituições originais da burguesia europeia ou dos EUA que admitiam o direito
do povo de derrubar seus governos ilegítimos. O Brasil está longe da democracia
burguesa. Também não me refiro à luta armada e sim ao conservantismo da
imprensa que acusa manifestantes de portar vinagre e estilingue.
Passados mais de dez anos da eleição de
Lula, como você encara a disputa ideológica na sociedade? Quem está ganhando a
disputa de “corações e mentes”?
É cedo para dizer. O melhor é que os
novíssimos movimentos sociais despertassem uma nova consciência crítica. Já a
aposta da classe média tradicional pode ser a de uma falsa terceira via (Campos e Marina). Ela
aceitaria as políticas sociais de Lula e romperia
com o PT, o suposto responsável pela violação dos princípios da classe média:
eficiência do Estado, ética etc. Tudo mentira, é claro. A classe média
brasileira é extremamente corrupta. Já o PSDB ainda não
aprendeu com aquele artigo de FHC sobre o
papel da oposição. A disputa está agora no campo dos valores, aquele em que
o PT deixou de atuar.
Como você avalia o primeiro ano do
governo de Fernando Haddad em São Paulo?
Regular. Teve o
imprevisível: as manifestações de junho. Não soube lidar com elas. Depois,
avaliou mal (como todo o PT) o novo aspecto da dominação burguesa no Brasil que
deslocou sua hegemonia do discurso do mercado para o judiciário. Foi assim que
um IPTU garantido pela Câmara Municipal foi derrotado. A comunicação é ruim
porque o prefeito não consegue sequer explicar as coisas boas que fez, como
novos corredores de ônibus. E como bom petista, o prefeito não vai radicalizar.
Por fim, gostaria de perguntar que
balanço você faz da gestão Rodas (2010-2013) na Universidade de São Paulo.
Ele foi uma figura singular num
período especial da história da USP. Hoje ela é uma universidade com forte
discurso neoliberal. Mas Rodas trazia
práticas da ditadura Militar, à qual ele servira. Ao mesmo tempo surfou na onda
de aumento da arrecadação do ICMS. Ele foi uma espécie de Maluf da reitoria, ou
seja, alguém com apoio “popular” conservador. Fez e desfez obras sem se
preocupar com os gastos e distribuiu dinheiro sem aumentar salários
convenientemente, através de prêmios, cartões de refeição e bolsas.
Se a campanha for
assim, teremos a maior abstenção da história. Se a discussão não for sobre a
economia do cotidiano, a vida real das pessoas, e ficar numa acusação rasa e
direta entre as candidaturas, teremos a maior abstenção da história.
O que a classe média quer?
Quer poder sonhar
com tranquilidade, ter um nível de estabilidade que permita traçar planos para
ir além. É esse o medo que ela tem hoje, o medo está nessa segurança de que ela
vai poder continuar a realizar os sonhos. Parte considerável do mau humor da
sociedade tem a ver com isso.
E o que mais pesa na hora da compra?
Depende da
categoria. Cada vez mais, a classe média compra na relação custo-benefício. São
as marcas em que ela confia. Nesse processo de alta inflacionária, está fazendo
mais pesquisa de preço para não ter de abrir mão das marcas que conhece.
O preconceito diminuiu?
Vai diminuir por um
motivo torto. Cada vez mais as pessoas estão saindo da classe C e indo para as
classes A e B. São pessoas que têm bolso de classe A e B e cabeça e jeito de
pensar de classe C.
Como você avalia seu trabalho à frente
do Data Popular?
Costumo dizer que
sou um angustiado estrutural (risos). Estou feliz por poder dar voz a um Brasil
que não teve voz durante muito tempo. Mas ainda temos de avançar muito para
diminuir o preconceito da elite em relação aos emergentes – não só de classe,
mas os negros, os idosos, as mulheres. A classe C não existiria sem as
mulheres, por exemplo. Mostrar as desigualdades do Brasil é uma coisa que me
motiva. Sou apaixonado por gente.