Carta em defesa da Democracia - Diocese de Goiás, GO.
O Povo de Deus das comunidades e paróquias da Diocese de Goiás reunido na XXª Assembleia Diocesana na Cidade de Goiás de 27 a 29 de abril de 2018, considera que há uma ameaça intencional à democracia brasileira para defendê-la, vimos nos expressar, publicamente, objetivando orientar os cristãos de nossas comunidades.
Eis a carta.
Pode ser copiada para reflexão na sua pastoral ou grupo.
Consideramos que a democracia
está ameaçada quando se aumenta a desigualdade social; quando o desemprego bate
recordes; quando a violência atinge os pobres e, dentre eles, os
jovens negros que moram nas regiões periféricas; quando a força policial trata
a população como inimiga; quando os defensores dos direitos humanos são
seletivamente ameaçados e mortos; quando não se garante o amplo direito de
defesa e a presunção de inocência; quando os recursos públicos são
utilizados para beneficiar uma pequena parcela da população; quando 6 pessoas
no Brasil detém a mesma riqueza que a metade da população mais pobre;
quando 5 (cinco) famílias detêm as maiores redes de comunicação do
país; quando os poderes da República, especialmente o Judiciário, são usados
para criminalizar os movimentos sociais e seus militantes; quando há
retirada de direitos, duramente conquistados pela sociedade e quando há uma
visível desmoralização da Política enquanto saída possível para um país mais
justo e solidário.
A democracia é o sistema de
governo em que a fonte de todo o poder é o povo e esse poder é serviço à
sociedade. A democracia funciona quando se respeita a dignidade da pessoa
humana; reduz as desigualdades; garante o pluralismo de ideias e opiniões;
quando os direitos sociais são efetivados e garantidos e objetiva construir um
país justo e solidário. Esses princípios estão garantidos nos artigos 1º e 3º
da Constituição da República.
O Papa Francisco na Exortação
Apostólica Evangelii gaudium, n. 202, vai a raiz desse problema: “enquanto não
forem radicalmente solucionados os problemas dos pobres, renunciando à
autonomia absoluta dos mercados e da especulação financeira e atacando as
causas estruturais da desigualdade social, não se resolverão os problemas
do mundo e, em definitivo, problema algum. A desigualdade é a raiz dos males
sociais.”
Parece evidente que temos que ir à raiz dos problemas para resolvê-los, mas o que ocorre hoje é que os meios de comunicação e as redes sociais escondem o grave pecado estrutural (Puebla 17, Medellin, doc. da Paz, 19) da desigualdade. O Papa Francisco, diz que a mídia tem três pecados a desinformação, a calúnia e a difamação:
“Estes dois últimos são graves,
mas não tão perigosos como o primeiro. [a desinformação](...) a desinformação é
dizer a metade das coisas, aquilo que para mim é mais conveniente e não dizer a
outra metade. E assim, aquilo que vejo na TV ou aquilo que escuto na rádio não
posso fazer um juízo perfeito, pois não tenho os elementos e não nos dão estes
elementos.” (Discurso para a Associação Corallo em 22/03/2013).
Os meios de comunicação (TV,
rádios, sites e internet) concentrados no Brasil se transformaram em
defensores da desigualdade, da violência, da concentração de renda, da
criminalização dos movimentos sociais e do convencimento das pessoas
de que é bom retirar os direitos conquistados. A mídia concentrada desinforma
intencionalmente.
As ameaças a democracia hoje são
bem concretas, sendo amplamente usadas pela mídia: ao exaltar um discurso
contra a corrupção esconde a redução da carga tributária e
o perdão de dívidas públicas das grandes empresas; ao tratar a Petrobras como
antro de corrupção esconde a entrega dos poços de petróleo do pré-sal para
as empresas multinacionais; ao focar só na corrupção de alguns setores
políticos oculta o assalto histórico dos bens do povo brasileiro desde a
colonização; ao mirar em crimes pequenos contra o patrimônio escamoteia o uso
do governo para deixar os ricos mais ricos.
Uma das ameaças a democracia mais
visíveis é a produção do ódio, para que a população mais pobre veja os
seus iguais como inimigos e adversários. Isso tem gerado a desumanização das
pessoas, alguns querem aniquilar e destruir as pessoas que pensam diferente ou
que querem defender os mais pobres.
O Papa Francisco, discursando aos participantes do 3º Encontro Mundial dos Movimentos Populares no Vaticano, diz que o amor dos cristãos deve derrotar os sistemas malignos. “(...). Ódio por ódio só intensifica a existência do ódio e do mal no universo. (...) Em alguma parte, deve haver alguém que tem um pouco de bom senso, e aquela é a pessoa forte. A pessoa forte é aquela que é capaz de cortar a cadeia do ódio, a cadeia do mal” (Exot. Apostólica Amoris Laetitia, n. 118)”.
Está na hora de dizermos com o
Beato Dom Oscar Romero:”(...) Em nome de Deus e desse povo sofrido […]
peço-lhes, rogo-lhes, ordeno-lhes em nome de Deus, cessem a repressão.” E com
Jesus: “E quando fizeres isso ao menor dos meus irmãos é a mim que fizestes.”
(Mt 25, 40).
Assim o cristão, na defesa da
democracia integral para a maioria da população, deve:
- Derrotar os sistemas malignos
com o amor, “a compaixão, a misericórdia, a palavra e a prática de Jesus”
(Opção Fundamental da Diocese de Goiás);
- Afastar-se da promoção de
qualquer violência, inclusive, não admitindo que candidatos ou propostas
políticas violentas prosperem entre nós.
- Denunciar a desinformação e as
mentiras que a mídia produz.
- Cessar os discursos de ódio e
de discriminação contra quaisquer pessoas, grupos ou nações.
- Lutar para manter os direitos
que foram ou ameaçam ser retirados do povo brasileiro para que todos “tenham
vida e vida em abundância” (Jo 10, 10).
- Fortalecer as organizações
populares.
Seguindo o conselho de Paulo:
“Mas tu, sê sóbrio em tudo, sofre as aflições, faze a obra de um evangelista,
cumpre o teu ministério. (2Tm 4,5).
Cidade de Goiás, Centro Diocesano
de Pastoral, 29 de abril de 2018.